DE SOLDADO DA RAINHA A MARIA PADILHA
DISSIDÊNCIAS SEXUAIS E DE GÊNERO NO SANTO DAIME
DOI:
https://doi.org/10.31668/rta.v23i01.12296Palavras-chave:
Santo Daime, Umbandaime, Gênero, CuírResumo
Neste texto procuro, através do resgate de memórias autoetnográficas, trazer a minha experiência de membro da religião do Santo Daime para discutir questões de gênero presentes nesta, onde procuro demostrar, em diálogo com referenciais teóricos cuír e decoloniais, que o culto daimista possui uma visão binária e essencialista do gênero e do sexo, alicerçada no chamado regime político da heterossexualidade. Todavia, trago também as possibilidades de rasura e transgressão deste mesmo regime binário dentro do Santo Daime, especialmente através da introdução da Umbanda na ritualística daimista (Umbandaime), havendo com isto a presença de performances de gênero variadas dentro do rito, mesmo que ainda limitadas à separação binária do sexo e do gênero. Concluo, ao final, que os sincretismos e ambiguidades presentes no Santo Daime fazem com que os corpos divergentes da matriz de inteligibilidade heterossexual possam encontrar espaços de vivências outras, através dos cruzos e das rasuras.
Referências
ALVERGA, Alex Polari de. O guia da floresta. Rio de Janeiro: Nova Era; Record, 1984.
ALVERGA, Alex Polari de (org.). O evangelho segundo Sebastião Mota. Céu do Mapiá: Cefluris Editorial, 1998.
ALVES JUNIOR, Antonio Marques. Tambores para a rainha da floresta: a inserção da umbanda no santo daime. 2007. 271 f. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007.
BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2017.
CAVNAR, Clancy. The experiences of gay and lesbian people using ayahuasca. 2011. Dissertation (PsyD in Clinical Psychology) – John F. Kennedy University, Pleasant Hill, CA, 2011.
COLLING, Leandro. Impactos e/ou sintonias dos estudos queer no movimento LGBT do Brasil. In:
GREEN, James N.; QUINALHA, Renan; CAETANO, Marcio; FERNANDES, Marisa (Orgs.). História do movimento LGBT no Brasil. São Paulo: Alameda, 2018. p. 515-531.
DIAS, Claudenilson; COLLING, Leandro. Resistências e rejeições nas vivências de pessoas trans no Candomblé da Bahia. Ex æquo, n. 38, p. 95-110, 2018.
COUTO, Fernando La Rocque. Santos e xamãs: estudos do uso ritualizado da ayahuasca por caboclos da Amazônia, e, em particular. 1989. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade de Brasília, Brasília, 1989.
FERNANDES, Estevão Rafael. Quando existir é resistir: two-spirit como crítica colonial. Revista de Estudos e Pesquisas Sobre as Américas, v. 11, n. 1, p. 100-122, 2017.
FERNANDES, Vera Fróes. História do povo Juramidam: introdução à cultura do santo daime. Manaus: Suframa, 1986.
GROISMAN, Alberto. Eu venho da floresta: um estudo sobre o contexto simbólico do uso do Santo Daime. Florianópolis, SC: Editora da UFSC, 1999.
GUSMAN NETO, Celso Luz. Transgredir é inevitável: pontos de tensão entre umbanda e santo daime. 2012. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.
HARAWAY, Donna. Manifesto ciborgue: ciência, tecnologia e feminismo-socialista no final do século XX. In: TADEU, Tomaz (org.). Antropologia do ciborgue: as vertigens do pós-humano. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2009. p 33-118.
HARAWAY, Donna. Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, Campinas, n. 5, p. 7-41, 1995.
LABATE, Beatriz Caiuby. A reinvenção do uso da Ayahuasca nos centros urbanos. Campinas: Mercado de Letras, 2004.
LABATE, Beatriz Caiuby; ROSE, Isabel Santana de; SANTOS, Rafael Guimarães dos. Religiões ayahuasqueiras: um balanço bibliográfico. Campinas: FAPESP; Mercado de Letras, 2008.
LAQUEUR, Thomas. Inventando o sexo: corpo e gênero dos gregos a Freud. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1996.
LUGONES, María. Colonialidade e gênero. In: HOLLANDA, Heloísa Buarque de (org). Pensamento feminista hoje: perspectivas decoloniais. Rio de Janeiro: Editora Bazar do Tempo, 2020. p. 52-83.
MUSSKOPF, André S. Por mais viadagens teológicas. Revista Cult, n. 202, p. 34-37, jun. 2015.
OYEWUMI, Oyeronke. Conceituando o gênero: os fundamentos eurocêntricos dos conceitos feministas e o desafio das epistemologias africanas. In: HOLLANDA, Heloísa Buarque de (org). Pensamento feminista hoje: perspectivas decoloniais. Rio de Janeiro: Editora Bazar do Tempo, 2020. p. 84-95.
PLATERO, Lígia; PLATERO, Klarissa. Uma experiência de casamento homossexual no santo daime. Chacruna Brasil, 2020. Disponível em: https://chacruna-la.org/uma-experiencia-de-casamento-homossexual-no-santo-daime/. Acesso em: 25 mar. 2021.
PRECIADO, Paul Beatriz. Manifesto contrassexual. São Paulo: N-1 Edições, 2017.
RUFINO, Luiz. Pedagogia das encruzilhadas. Rio de Janeiro: Mórula Editorial, 2019.
SANTOS, Charlie Drews Tomaz dos. Concepções de professores de ciências sobre gênero, sexo e sexualidades: possibilidades de educação transviada. 2020. Dissertação (Mestrado em Ensino e História das Ciências e da Matemática) – Universidade Federal do ABC, Santo André, SP, 2020.
SANTOS, Silvio Matheus Alves. O método da autoetnografia na pesquisa sociológica: atores, perspectivas e desafios. Plural, v. 24, n. 1, p. 214-241, 2017.
SILVA, Tomaz Tadeu da. Monstros, ciborgues e clones: os fantasmas da pedagogia crítica. In: COHEN, Jeffrey Jerome et al. (Orgs.). Pedagogia dos monstros: os prazeres e os perigos da confusão de fronteiras. Tradução de Tomaz Tadeu da Silva. São Paulo: Autêntica, 2007. p. 11-22.
SIMAS, Luiz Antonio; RUFINO, Luiz. Fogo no mato: a ciência encantada das macumbas. Rio de Janeiro: Mórula Editorial, 2018.
TIBURI, Marcia. Feminismo em comum: para todas, todes e todos. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2019.
VERGUEIRO, Viviane. Por inflexões decoloniais e identidades de gênero inconformes: uma análise autoetnográfica da cisgeneridade como normatividade. 2015. 243 f. Dissertação (Mestrado em Cultura e Sociedade) – Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2015.
VERSIANI, Daniela Beccaccia. Autoetnografia: uma alternativa conceitual. Letras de hoje, v. 37, n. 4, p. 57-72, dezembro, 2002.
WITTIG, Monique. Não se nasce mulher. In: HOLLANDA, Heloísa Buarque de (org). Pensamento feminista hoje: conceitos fundamentais. Rio de Janeiro: Editora Bazar do Tempo, 2019. p. 83-92.
